11 agosto 2011

Um Amor Amazonico Que Virou Inquerito

Nunca se vira algo sequer parecido na Receita Federal. Passo a contar-lhes, ja no paragrafo seguinte, uma historia de amor, que começou numa padaria e foi parar numa comissao de inquerito. Os incriveis acontecimentos tiveram como palco uma das cidades do interior do Para. O casal apaixonado viu-se, de uma hora para outra, cercado por populares, advogados e legitimos interessados no deslinde do caso.  Nao incorro em exagero se lhes disser que o enclave amoroso foi examinado a luz do Estatuto dos Servidores Federais,  enumerado como Lei 8.112, colocando um dos consortes sob risco de ser jogado na rua da amargura. Uma tal desventura somente nao veio ao mundo juridico, graças a um advogado tao habil quanto espirituoso. Para nao me alongar na preliminar, concluo o paragrafo dizendo que o caso pode interessar a todos quantos estudam a mencionada lei, em especial os capitais artigos 116 e 117, cujo rol de incisos preve o que deve e o que nao deve fazer o funcionario. E tambem o que nao deve fazer jamais, sob risco de levar o pontape que o expulsa do serviço publico, devidamente publicado no diario oficial.

Adiante! Mozart Lecharmant recem havia chegado na Receita. E como sucede com muitos, o Auditor-Fiscal foi mandado chefiar uma agencia no interior do Para. La chegando, nao teve que desembolsar com hotel, dado que a agencia tinha dependencias para o chefe morar.

Todos os dias, ele passava na padaria, que ficava na mesma rua da Receita. A rotina do bate-ponto as seis e meia da tarde, fez Mozart notar a beleza paraense que lhe cobrava paes, presunto e uma caixa de leite. E foi ele tambem percebido pela moça. Nao tardou, e enamoram-se.  Mais um pouco, e estavam apaixonados. Ele, livre e desimpedido. Ela, nem tanto, posto que era a mulher do dono da padaria, um sujeito que dava um duro danado, levando paes ao forno, debaixo do calor inclemente da floresta.

Antecipemos que a cidade carecia de moteis - e somente por isso eh que um inquerito foi para cima Mozart. Ao jovem casal faltava o local para os encontros intimos, deficiencia que o Auditor supriu da seguinte forma: numa sexta a tarde, dispensou todos os funcionarios, ao argumento de a tarde estar modorrenta, sem viva alma pra atender. Em minutos, estava sozinho. Fechou a porta principal e colocou um aviso: abriremos na segunda, obrigado pela compreensao. Estando a agencia fechada, so uma viva alma bateu a porta, e era ela - a beleza do Para.  

Entrementes, o padeiro, que ja vinha sendo alertado sobre os descaminhos da mulher, conversava com seu advogado:

- Consulta medica que nada! Ela foi eh se encontrar com aquele cabeça chata. Hoje eu mato a vagabunda e o vagabundo. 

- Eh puro desatino. Voce vai em cana, pois nao tem mais essa historia de defender a honra. Tenho uma proposta.  

- Pois fale logo, antes que eu leve meu 38 pra conhecer a Receita Federal. 

- Calma, homem! Quem merece puniçao eh ela, nao voce. Vamos dar um flagrante, com testemunhas. Voce fica na boa, e ela se lasca. Nao tem que ter medo de escandalo, pois a lingua do povo ai fora nao fala de outra coisa. 

- Pai da egua, voce ta certo. Quase ia fazendo besteira.

Connvencido o padeiro traido, la se foram eles, no rumo da Receita. Pelo caminho iam arregimentando conhecidos, que tao-logo ficavam sabendo da missao, sentiam-se como justiceiros:  

- Doutor, a coisa tava trancada aqui, oh! Um homem bom e trabalhador nao merece chifre desse jeito.  

- Entao vamos la, senhoras e senhores - ja quase gritava o advogado, para ser ouvido pela aglomeraçao.

E assim foram indo, de modo que chegou a agencia da Receita uma pequena multidao de vivas almas, loucas de curiosidade. Como se fosse combinado, o povareu vinha na ponta dos pes, para nao por a perder o flagrante. Os que iam na frente, ao toparem com o cartaz na porta, disseram num sussuro: 

- So pedalando,doutor.

O  advogado acenou um sim, e a robusta porta cedeu aos pontapes unidos. 

A primeira coisa que viram foi um casal apavorado, de olhos esbugalhados, no mesmo estado em que vieram ao mundo. 

- Muito bonito, hein! - disse o advogado, investido no cargo de porta-voz da comitiva. 

Fechemos por ora a cortina, com o final do primeiro ato.  Amanha, veremos como um outro advogado conseguiu livrar o Auditor Mozart de uma demissao tida como inevitavel, dando uma interpretaçao original a lei. Aguardem!
  

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