- Mas como explica o sumiço de 150 celulares motorola da sala ao lado...
- Eu nao sei, doutor. So sei que eu nao fui.
- E o estoque de 50 mil folhas de papel consumido em apenas dez dias...
- Uai! O povo tava copiando adoidado naquela semana. Achei ate que a maquina ia arriar!
O Ze 27 era um agente administrativo, que batia ponto no setimo andar do predio sede do Ministerio da Fazenda, em Brasilia. Sobre ele recaia a suspeita de ter afanado nada menos do que 150 celulares novos, na caixa, que a Receita Federal havia comprado para distribuir as chefias.
Mas um detalhe estava quebrando a cabeça dos investigadores. Como ele teria passado com a volumosa carga pela segurança, presente dia e noite na portaria central! A carga inteira sumiu em um mes. Se o ladrao tivesse roubado a prazo, mesmo assim teria que usar uma pequena mala, visto que teria que carregar cinco caixas por dia. E havia o enigma das 50 mil folhas de papel A4, que foram consumidas em pouco mais de uma semana! Por que diabos o xeroqueiro iria querer tanto papel!
A comissao investigadora chamou os seguranças:
- Conhecemos o seu Ze 27, e ele sempre sai pela portaria de maos abanando - disseram todos.
Nada havia contra o Ze, senao o primeiro impulso dos investigadores de considerar o homem um suspeito. A certa altura, um membro da comissao arguiu: Tamos fazendo papel de besta, e ainda escolhendo o mais humilde pra Cristo. Por que o ladrao nao poderia ser um Analista ou Auditor, me digam!
Ninguem disse nada! A constataçao havia calado fundo no trio investigador, que ja sentia pesar-lhe nos ombros o infarto do Ze na vespera, decerto provocado pela pressao das inquiriçoes. No domingo, o presidente da comissao entendeu ser humanitario visitar o Ze no hospital. Na segunda, foi surpreendido: o advogado pediu a juntada aos autos de um termo de constataçao, cujo titulo ja dizia tudo: abuso de poder levou a comissao a interrogar paciente no leito de morte. Mas o Ze, maçudo e forte, recuperou-se bem, e um mes depois ja estava a postos, tirando xerox para o andar inteiro. E tinha a defende-lo um advogado de morte!
A comissao ja se preparava para encerrar o inquerito por falta de autoria. Para um crime, no entanto, certo. Teria que assumir o desgate pelo malogro na investigaçao, fora ter que suportar os piadistas no aguardo. De subito, um vogal teve uma ideia: Colegas, muito mal comparando, mas se voces roubassem 150 motorolas na caixa, onde eh que iriam vender...
- Nao faço ideia - disse um.
- Nem eu - disse o presidente.
- Pois bem se ve que voces nao entendem de ladroagem! Aqui em Brasilia, so na feira do paraguai. Vamos la! Agora!
Chegando a feira, logo descobriram um vendedor que tinha um lote dos celulares:
- Voce ta vendendo coisa roubada da Receita. De quem voce comprou...
- Num me lembro, fregues!
- Esquecidinho, hein! A policia vai dizer que foi voce. Te prepara!
- Perai. Foi do homem da brasilia laranja, que vende caderno.
- Qual o nome dele...
- Ze.
Estava esclarecido o caso. Era mesmo o Ze 27 o autor da proeza. Depoimentos de alguns feirantes e copias de cheques demitiram o o homem. Descobriu-se tambem que fim levou aquela montanha de papel: caderno. Ele traçava linhas numa folha de papel e mandava a copiadora trabalhar. Depois, furava, colocava a espiral e ia abastecer a feira do rolo.
Ja fazia um mes que o diario oficial havia mandado o nosso recordista passear, quando o ex-presidente topou com ele, zanzando no Conjunto Nacional.
- Oi, Ze. Ja arrumou emprego...
- Trabalho por conta, doutor. Sou encanador.
- Bem, voce foi expulso, e o nosso jogo acabou. So queria saber uma coisa na vida: como eh que voce fez pra passar com 150 caixas de motorolas...
- O que eu ganho com isso...
- Que tal uma caixa de ferramentas agora mesmo...
- Posso escolher...
- Pode, Ze, pode.
- Olha aqui, doutor! Desci tudo pela corda, da janela dos fundos. Em noite sem lua.
A comissao tinha aventado essa hipotese, logo descartada por parecer fantasiosa. E, no entanto, era verdadeira. O Ze saiu feliz com a caixa de ferramentas, de serventia ao seu novo oficio.
Foi facil por na rua o vendedor de cadernos e celulares. Muito mais dificil seria dar o mesmo destino aos vendedores de legislaçao, que nao aceitariam caixas de ferramentas, mesmo depois do bilhete-azul. Por esse tempo, enquanto o xeroqueiro, ajudado pelo breu da noite, baixava telefones por uma corda, o dr. Lastforever e sua trupe baixavam atos normativos sob encomenda - e iam fazendo fortuna.
Eita! ladroagem de alto a baixo!
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