20 julho 2006

Alckmin, chame a polícia, não os ladrões


Acendeu o sinal amarelo na campanha de Lula. Heloísa Helena vem arremetendo e atinge 10% das intenções de voto. Lula cai mais um pouco, de 54 para 52%.
Desconfio que o cidadão autor dos dizeres na placa ao lado respondeu à última pesquisa do Datafolha.
É só o começo das dores. Lula, que gosta e abusa de imagens futebolísticas, sabe que num segundo turno está mais para a França do que para Itália. Seu governo está na marca do pênalti, e os petardos certeiros que serão disparados contra sua meta vão furar a rede.
Eis aí a maldição do homem: ou ganha no primeiro turno ou perde. Mas como ganhar no primeiro turno com o PT que o Brasil inteiro finalmente conheceu, um partido "diferente de tudo o que aí está" - e põe diferença nisso! Como Lula se desvencilha do partido que criou?
O núcleo petista iludiu-se, achando que lhe bastaria dar um pé no traseiro de Palocci, Dirceu, Delúbio e Silvinhos, para consolidar-se a imagem de um presidente traído, desinformado porém honesto. Deram com os burros na água: a imagem capenga perdurou de forma precária, muito mais por inércia das oposições que se omitiram do que pelo estratagema petista. Tinha aquela coisa de ameaçar com o chavismo, lembram? Lula tomando café em canteiro de obra, abraçando "o povo", a UNE, a CUT, o MST, entupidos de verbas generosas, denunciando "golpismo". A oposição, que não tem tradição de bater panela na rua, foi deixando estar...
Contudo, mesmo a imagem de um chefe de Estado desinformado, quase catatônico, não lhe faria bem, pois reacende no eleitor a desconfiança de que a desinformação de Lula é antes por ser ele um despreparado do que por ser honesto. O azar dele foi ter crescido em meio à podridão toda. Infundiu nos petistas, sempre tocados pela presunção, a falsa idéia de que a questão ética estaria esgotada pelo cansaço do eleitorado com CPIs e impunidade. "Agora é Lula e a economia" - eis o bordão que já iam cantando como a marca da vitória.
De súbito, tudo vem abaixo. São Paulo, Minas e Rio querem acertar as contas com o PT, e vão fazê-lo. Já sem estes três estados vencer as eleições no Brasil é como ganhar a São Silvestre correndo de farda e coturno. E ainda falta o Rio Grande do Sul, cuja agricultura foi massacrada no governo Lula, de forma covarde e cruel. Aqui nos pampas também lhe será cobrada a fatura, e ainda de seu preposto, o candidato Olívio Dutra, que logo, logo, receberá o recado para levar ao chefe: "Sai fora". Olívio, aliás, só é candidato ao governo do Rio Grande do Sul porque Lula e Severino mandaram-no embora do Ministério das Cidades, de onde não queria sair (para ficar, ele dizia, então, algo como: "Quem disser que sou candidato não fala por mim...") ; assim não fosse, estaria até hoje por lá, prosseguindo aquela administração chinfrim que não dava conta de gastar a verba destinada. A candidatura Olívio no RS é conseqüência de uma decisão de Severino Cavalcante, que o desempregou em favor de um apadrinhado cujo nome nem me ocorre mais.
Olívio é sobra do ministério de Lula. O Estado gaúcho, fiel às tradições mais elevadas de seu passado político - de ser a contramarcha da bandalheira nacional - vai empacotá-lo para devolução. Por que os gaúchos têm de se conformar com quem nem Lula nem Severino quiseram? E não nos venha com essa história empolada e falsa de gaudério. Pilcha sem tradição é mera fantasia. Ora, vai lamber sabão.
In fine, Alckmin, sei, deve estar exultante - as coisas parecem conspirar a favor. Mas que se cuide; é bom se afastar de figuras carimbadas pela corrupção federal, o rebotalho ante-delubiano, já esfregando as mãos. Fosse eu petista, exploraria este fato, dá um bom samba-confusão, em favor do segundo mandato. Duas ou três figuras que já andam falando em nome de "Alckmin presidente" tem uma folha-corrida e tanto. É só buscar numa vara de justiça federal e mandar ver. Quando aposto que Lula perde, faço-o dentro de certas condições que não incluem o sinistro de a oposição pôr em cena outra vez velhos ladravazes saídos da quarentena. Se não, o eleitor ainda acaba perguntando: "Mudar para quê?"

16 julho 2006

Não É Para Incomodar, É para Destruir


Incomodar é pouco, é nada. Disputo uma vaga no Congresso Nacional, como deputado federal pelo PDT, com o propósito de trabalhar pelo extermínio da corrupção política. Nefelibata? Não, isso é possível. Por que temos de viver de pesadelo em pesadelo, sem um ou outro sonho bom para entremear?
O propósito fundamental que me anima é o de meter a mão nos que metem a mão no dinheiro público, aproveitando-se de cargos com algum ou muito poder.
Buscar no mandato uma trincheira para acertar o alvo principal: a corrupção política, que é a mãe de todas as corrupções. Pois debaixo do sistema político corrupto correm livres servidores públicos vigaristas, empresários sonegadores e contribuintes de caixa-dois, tesoureiros bandidos e - na outra face da imundície - as investigações e tribunais-faz-de-conta, que nada apuram, retroalimentando os políticos impunes, que nomeiam novos corruptos de confiança...que fazem o que eles mandam e assim por diante, ou melhor: assim para trás. Tudo reunido é uma podridão só, que joga o país no atraso e na miséria.
P
or falar em sonegador, meu mandato será um esforço permanente pelo fortalecimento da Receita Federal, em defesa da integridade de suas funções, essenciais ao país, e da valorização de seu quadro de pessoal, submetido ao descaso prepotente e a um arrocho salarial inversamente proporcionais à eficácia do trabalho fiscal.
Claro que a corrupção à que me refiro sobretudo é essa aí, mensaleira, organizada em quadros, com seu séquito de tesoureiros e guarda-livros, registrando a roubalheira impune do dinheiro público em "recursos não contabilizados", sob o olhar complacente dos omissos.
Não nos afastemos da realidade, está certo. Ladrões e ladrõezinhos na vida pública, ainda teremos de suportá-los por mais longo tempo. Que seja, contanto que eles venham roubar-nos como desde os tempos idos, avulsos ou em pequenos bandos, um aqui, outro acolá, e prossigam admitindo diante do espelho, escondidinhos: "Somos gatunos mesmo". Desses a polícia cuida. Porém, diante da maior quadrilha da história republicana...ops! A ladroagem agora empilha cadáveres. Aí é a polícia que tem de se cuidar, e não só ela; as autoridades públicas que os investigam também. São ladrões que acenam sempre as "mãos limpas" (lavar dinheiro deixa as mãos limpas?), eram os "campeõs da ética" de até bem pouco e agora acenam a bandeira do "desenvolvimentismo", chamando os incautos para a defesa da economia. Não hesitam em assumir uma esquizofrenia que os convence da própria mentira: "Somos honestos", repetem para si mesmos, para não perderem o vezo. E atacam com sórdida violência as autoridades, na busca da inversão dos papéis; eles são recordistas na propositura de processos judiciais contra jornalistas e autoridades públicas.
Façamos a campanha eleitoral para derrotá-los também no Congresso; depois a Justiça cuide de enfiá-los na cadeia para assegurar a liberdade de todos e de cada um e, ainda, o próprio Estado de Direito, sob mira da corrupção, vitoriosa porque impune.

13 julho 2006

A Longa e Tormentosa Estrada da Loucura


"Aquele que luta contra os monstros deve cuidar-se para não se tornar um monstro também". (Nietzsche)


Poucos como o alemão Friedrich Nietzsche fizeram tantos aforismos de grande impacto e escreveram com o mesma força literária. Muitos o consideram o maior escritor da língua alemã, idioma, como se sabe, com uma riqueza tal, que seus falantes vêem no inglês um subconjunto dele.
Nietzsche fez e faz as cabeças. Os nazistas, em primeiro, viram no filólogo e filósofo patrício a base filosófica para todas as atrocidades que viriam a cometer, em particular contra o povo semita. No apelo nietzschiano à humanidade para que se supere a si mesma, em busca do homem superior, já se encontra o germe do monstro nazi. Somos ainda rascunhos do homem que virá. Rascunhos jogam-se fora, o que importa é a obra acabada.
Todo homem imperfeito é rascunho, tentativa da natureza em busca do tipo superior que ela almeja. "O homem é uma corda estendida entre o animal e o que vem além do homem, uma corda sobre o abismo; é o perigo de transpô-lo, o perigo de olhar para trás, o perigo de estar a caminho, de tremer e parar. Grande no homem é ser uma ponte e não um fim; o que pode ser amado no homem é que ele é um passar e um sucumbir".
O filósofo alemão não acreditava na verdade, na contramarcha de Aristóteles e Platão. Racionalismo e lógica, asseverava Nietzsche, era empulhação socrática, e Sócrates era, ele mesmo, um decadente. O homem aspira à arte, à tragédia, e não à lógica. Nações no auge não produzem lógica, produzem teatro e vida estética; na decadência é que vem a lógica, e a Grécia antiga demonstrava-o. Não foi por acaso que o nazismo foi um movimento estético (culto do belo, eugenia, limpeza, monumentalismo). E Nietzsche ia assim escrevendo para a posteridade que o acolheria, assegurando haver no homem uma pulsão incompreendida, para além do racional, e que o anima verdadeiramente - sendo, afinal, o que importa.
A psicanálise e Freud em especial foram arrebatados pelas idéias do filósofo alemão. O inconsciente freudiano resume-se a pulsões dominantes incompreendidas, que fazem da própria linguagem seu instrumento para manifestar-se, notadamente nos atos falhos e nos sonhos (expressão de nosso inconsciente). Não se sonha em vão, deve-se decifrar as expressões oníricas que nos visitam quando caímos no sono, eis aí Freud ensinando na garupa de Nietzsche.
Passado o nazismo, o fantasma do comunismo ainda ronda a América Latina, e hoje não mais combatem Nietzsche como o "reacionário"; ao contrário, precisam mesmo dele para alimentar a cultura do irracionalismo útil à causa macabra. A razão, contudo, opõe-se ao totalitarismo marxista, porque prega a busca da verdade, ao passo que o comunismo mutante diz que a verdade não existe como tal, sendo expressão ideológica das classes dominantes. E se assim é, tudo se dissolve no relativismo e improvisam-se outras "verdades", contanto que se prestem ao fim almejado: a supressão das classes e a construção do estado totalitário, que se dá em meio à efusão de sangue e genocídios já testemunhados pela história. Todas as implicações do nietzschianismo são trágicas.
"Não sou homem, sou dinamite", disse certa feita num surto profético antevendo o uso que as ideologias do mal - o comunismo e o nazismo - fariam de sua obra.
O autor de "Assim falou Zaratustra", cujo subtítulo foi "um livro para todos e para ninguém" considerava-o como "o livro mais profundo da humanidade", ainda hoje - e hoje sobretudo - exerce grande influência nos meios acadêmicos e intelectuais. Naquele estranho século dezenove, o livro teve de ser custeado às suas expensas combalidas de aposentado por invalidez (tinha uma cefaléia crônica, dores lancinantes de cabeça que o tiravam do ar). Morava numa pensão precária. Imprimiu cerca de quarenta exemplares da obra, que vende hoje aos milhões de volumes, em inúmeras traduções pelo mundo."Alguns homens já nascem póstumos", disse.
Nietzsche comprendeu, com sua profunda intuição, o dilema dos homens: ter de escolher entre cristianismo e o culto de Dioniso, o deus grego das matanças e bacanais. Dito de outro modo, entre a civilização e a barbárie. Errou na escolha, e elegeu Dioniso como o deus que festeja a vida, refutando o cristianismo como moral abjeta e decadente, de escravos ressentidos. "Deus está morto", anunciava o Nietzsche-Zaratustra, imitando em gênero literário (com bastante ironia) os próprios versículos bíblicos. Em face de sua integridade filosófica, manteve-se fiel a si mesmo e ao ateísmo apologético, até ser destruído pela própria obra que o conduziria ao labirinto onde foi devorado; um súbito colapso jogou-o nas trevas pavorosas da loucura (essa patologia misteriosa até os nossos dias), assim vegetando durante intermináveis 11 anos, sob os cuidados da mãe compassiva, até sobrevir-lhe a morte, em 1900. Sua intuição profunda não o advertiu do abismo, e a razão finalmente destruída foi a dele própria.