13 junho 2006

O Voleio do Ronaldo. Eeeta! Esquadrão de Ouro

Hoje é dia de estréia da seleção canarinho.
O senhor presidente ainda está meio zonzo com o voleio do Ronaldo, que lhe acertou a testa.
Tá vendo, não tem bola perdida; se tá gordo, não sei, mas é craque, e tem uma pontaria. Eeeeta, esquadrão de ouro! Já estamos de chuteiras, na terra de Goethe, em busca do hexa.
Louco é quem duvidar - pode desenrolar a bandeira, a taça do mundo é nossa.
O Brasil terá Pelé no ataque, soube agora mesmo. Ronaldo e Ronaldinho, um ou outro deverá substituir o rei, no caso de o peso da idade dobrar-lhe as pernas.
170 milhões de corações, vibrando de uma só vez. Não haverá desta vez o azar nem a frustração de 1974, que nos golpeou naquela mesma Alemanha gelada.
Por quê? O voleio certeiro do Ronaldo foi um prenúncio de vitória, poucos perceberam o benigno sinal.
Traz-nos aquele espírito de Pelé.
Pelé, o incomparável, irrefreável, indômito e sempiterno bola-pra-frente é o fundador da estética do futebol. Ser craque, super-craque ou que for, sempre haverá de ser alguma coisa mais ou menos próxima do que foi o rei. Ele é a medida de todos os craques.
Inventou jogar parado e jogar correndo, sem bola. Quando ninguém jamais imaginaria, sacou aquela paradinha na marca do pênalti, aumentando ainda mais a angústia do goleiro na hora do gol. Arqueiro pra lá, bola pra cá. Uma impulsão poderosa das pernas, e seu corpo, subitamente, erguia-se sobre os zagueiros grandalhões - outra cabeçada certeira, e gol.
Não adianta ser maior do que Pelé. Nem 4 nem 20 centímetros, que ele os sobrepassa no vôo. Na grande área, o rei fica sempre por cima, e os zagueiros são súditos. É de lei.
De nada adianta ser mais veloz que ele, que as fintas maravilhosas do rei são feitas justamente da velocidade do adversário, como o golpe do judoca que usa a força do oponente para vencê-lo.
Qual foi o gol mais bonito de Pelé, isto é, o gol mais bonito do futebol? Aposto que foi aquele que ele não fez.
Até então pensávamos que se driblava com os pés. O rei criador mostrou ao mundo que não apenas os pés, mas o gênio da bola faz o corpo todo driblar e vibrar, como um ritmo envolvente. Da copa de 70, foi a mais linda e perfeita jogada. Lançamento de Tostão, que faz o goleiro Mazurkiewicz sair em desabalada carreira para capturar a pelota. Lá vinha Pelé, também veloz, e assim passou pela bola e ainda pelo uruguaio, dando-lhe uma curva estonteante para, num instante, reencontrar-se sozinho com a esfera de couro, como um rei e sua amada. Foi a consagração na arena, o chute que se seguiu arrancou tinta da trave, e a pelota se foi pela linha de fundo.
Danem-se, se a bola não entrou, as multidões já estavam em êxtase com a perfeição duma jogada nunca dantes vista, e que seria contada de pai para filho desde então.
Ouvi do meu pai, conto aos meus filhos: "Meninos, eu vi".
A taça do mundo é nossa, com esse futebol não há quem possa. E não esqueçam: domínio de bola não é performance de embaixadinhas. Dizer que Pelé - credo! eles não sabem o que dizem - não faz embaixadinha ou truques de bola assim e assado é o mesmo que dizer que Mozart não tocava guitarra. Ah é?
Futebol encanta porque é sinfonia.
Bem, e se Pelé não jogar?
Talvez Pelé não jogue mesmo, afinal. É o peso da idade, que nos verga impiedosamente. Mas as medidas estão criadas, e com elas se medirá tudo no futebol. Lá estarão Ronaldo e Ronaldinho. Bem medidos, são eles os nossos grandes craques. São 70% de Pelé? Quem sabe 90%? Pouco importa, quanto melhor for um e outro, mais se aproximarão do rei, mais perfeitos serão. Já nos basta para trazer o hexa. Cem por cento Pelé, só ele mesmo, o mago inesquecível dos gramados, e sua arte que humilhava a imaginação.

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